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“Quitei e ele voltou a se endividar”

Um estudante de Medicina, de 24 anos, se viu diante de uma dívida de cerca de R$ 10 mil, adquirida com jogos em cassino on-line.

A primeira dívida, os pais pagaram, sob a garantia de que o problema não voltaria a acontecer, como contou a mãe do jovem, uma advogada de 51 anos, à reportagem de A Tribuna.

Só que a promessa não foi cumprida e, 20 dias depois, ele se viu novamente atolado em uma nova dívida. Desta vez, de R$ 5 mil.

Diferente da primeira vez, os pais decidiram não pagar. Deram uma missão para o filho de gerenciar os aluguéis de uma casa de veraneio em troca de comissões até quitar a dívida.

A TRIBUNA - Com quantos anos seu filho começou a jogar?

ADVOGADA - Ele começou a jogar com 14 anos. Eram jogos on-line, mas sem nenhum cunho comercial, nada de dinheiro. Era um jogo altamente viciante. Os anos foram passando e ele continuou.

Os jogos atrapalhavam muito as tarefas cotidianas, eram campeonatos. Ele deixava até de se alimentar, de estudar, deixou de se socializar com amigos em função do jogo. À época, buscamos ajuda médica e psicológica para que ele diminuísse o ritmo dos jogos.

> Quanto tempo ele ficava jogando?

Se deixasse, ficava oito, nove horas por dia. O tempo livre que tinha era jogando. Realmente é algo viciante. Eu tive que colocar outras atividades, coisas lúdicas, atividades extras para ele diminuir o ritmo.

> Diminuiu?

Diminuiu, mas nunca parou, até que veio o prejuízo financeiro. Aos 19 anos, ele começou a namorar, deu uma amenizada, mas nos momentos livre, voltava para o jogo.

> Com que dinheiro ele pagava os jogos?

Inicialmente, mesada. Por mês, ele recebia R$ 1 mil, que era para custear algumas despesas, como alimentação e momentos de lazer.

> E a dívida, como vocês descobriram?

Foi em abril deste ano. Ele usou toda a mesada e pediu mais dinheiro. Adiantei a mesada e mesmo assim não foi suficiente. Em três dias, foi a mesada toda e ele veio se abrir comigo, disse que estava altamente viciado.

> O que ele disse?

Ele contou que começou a jogar no início do ano em apostas em cassino on-line. Ele admitiu que jogar libera um neurotransmissor chamado dopamina, mas revelou que estava entrando em depressão.

Meu filho contou que fez um cartão de crédito que liberava até R$ 1 mil por mês e quando ele viu, em menos de dois meses estava atolado em uma dívida de R$ 10 mil.

O jogo é viciante, permite ganhar no começo, mas é feito para perder depois. Foi ali que o meu filho se desesperou.

> O que tem feito para ajudálo?

Apoio. Recorri à terapia, acompanhamento com psiquiatra, psicólogos, peguei licença do trabalho para ajudar no tratamento dele. É o último ano de faculdade.

Ele disse que estava muito mal e me pediu ajuda para saldar as dívidas e virar a página.

> Quitou a dívida?

Sim, em julho. Ele diminuiu nos jogos e prometeu que não entraria mais no cassino on-line, só que infelizmente não durou 20 dias. Fez dívida de novo. Mais R$ 5 mil. Eu fiquei muito revoltada e dei uma surra de cinto. Cheguei no auge do desespero de mãe.

> Pagou novamente a dívida?

Não quitei. Agora, o pai dele o colocou para trabalhar, tomar conta dos aluguéis de veraneio da nossa casa de praia. Ele controla tudo pelo celular e com parte do dinheiro que arrecada, vai abatendo a dívida.

> Ele concordou? Parou de jogar?

Ele está bem tranquilo. No cassino on-line, eu acredito que ele tenha parado, espero que tenha parado. Mas nos outros jogos on-line ele continua, mas eles não trazem prejuízo financeiro.

A minha preocupação é que ele, no futuro, gaste o dinheiro que irá ganhar na profissão com apostas. Farei de tudo para ajudá-lo a se libertar desse vício. No fundo, acho que ele se envergonha um pouco, é uma sensação de fracasso, imagino eu. É um drama, é um fantasma perseguindo a gente.

> Antes, como ele era?

Ele sempre foi um menino muito bom, inteligente. Gostava de sair, era muito sociável, risonho, brincalhão, mas se tornou um jogador compulsivo. A sensação que eu tenho é de impotência.

Reportagem Especial

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2023-12-01T08:00:00.0000000Z

2023-12-01T08:00:00.0000000Z

https://atribuna.tribunaonline.com.br/article/281565180522818

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